sexta-feira, 25 de julho de 2008

Ele olhava para ela, todas as manhãs.
Enquanto ainda dormia, no momento em que acordava, quando se espreguiçava e lhe dizia “bom dia!”.
Era extraordinariamente linda, quando se arrumava, mas, pela manhã, tinha todo um encanto.
Quase qualquer mulher é capaz de parecer bonita, quando está arrumada, mas poucas podiam se dar ao luxo de serem tão lindas no momento em que acordavam.
A observava com completa atenção, querendo absorver cada detalhe, cada poro, seu cabelo e as curvas de seu corpo, cobertas por uma calça desbotada e uma velha camiseta do Led Zeppelin.
Havia alguma coisa inexplicável nela, algo impossível de definir, mas ainda sim presente.
Algo que fazia com que cada célula de sua pele parecesse necessitar se encontrar com as dela.
Ela não acreditaria se ele lhe dissesse, mas a amava justamente nas horas em que ela se achava menos desejável.
Gostaria de lhe dizer que parecia mais sexy com aquela roupa velha, larga e desbotada do que com quando tentava ser.
Era linda quando estava brava, quando estava triste, acima de tudo.
Ele admirava-a pelos detalhes, os maravilhosos detalhes.
Aquela pequena cicatriz, o modo como andava, sua voz.
O conjunto de uma pessoa nos atrai, mas as pequenas coisas nos apaixonam.
Era mais um desses casos.
Mais um em 4 bilhões, mas, para ele, único.
E, de certo modo, ele estava certo.

sábado, 5 de julho de 2008

...então ele tomou outro bom gole de coragem e foi falar com ela.
Ainda era linda, como antes, embora mudada.
Ele queria, e ao mesmo tempo tinha medo de saber o quanto.
-Anda saindo muito?
-Com certeza. Sempre.
-E também. Minha vida anda muito divertida.
Mentira, da parte dele. Quase não saía, sua vida era um tédio.
Teria vergonha de narrar seu dia.
Mentira da parte dela. Quase não saía, sua vida era um tédio.
Teria vergonha de narrar seu dia.
Mas nenhum dos dois aceitaria deixar transparecer nada, pois não fazia idéia se o outro pensava a mesma coisa.
Nenhum admitiria a falta que o outro fazia, não dariam sinais de fraqueza.
A falta do outro podia ser forte, mas sem dúvida o orgulho era mais.
Ceder e ser o primeiro a dizer “oi”, à distancia, já era tremendamente difícil.
Para ambos.
-E então, ainda anda com aquele povo?
-Sim, a gente anda se divertindo muito. Sempre nos reunimos.
Traduzindo: Se reuniam para assistir filmes e falar coisas idiotas, nada assim tão legal.
-Ah, eu fui numa festa ontem!
Traduzindo: Uma tia fez aniversário e os primos se reuniram e falaram coisas idiotas, nada assim tão legal.
-Que legal!
Traduzindo: Nossa, ela tem uma bela vida social, bem diferente de mim. Que bosta!
-E então...
Devia perguntar se ele ainda tinha aquela foto?
Pensando bem, deixa pra lá...
-O que?
-Nada, esqueci o que eu ia dizer.
-Ah, sim.
Pergunto da foto?
Não, deixa que ele pergunte.
-Bom, vou indo, preciso encontrar uns amigos.
Não há encontro com amigos, e o que ele mais gostaria era continuar ali.
Mas é melhor assim.
-É, eu também. Tenho uma festa.
Ela também não tem festa alguma para ir.
-Então, até um dia desses.
-Até.
Vão se dar um beijo no rosto, para se despedir.
Nenhum dos dois toma a iniciativa, e, depois de um silêncio constrangedor, acenam um adeus e vão embora sem nem se tocarem.
Ela chega em casa, pensando que ele não quer nada com ela, realmente.
Sua vida parece estar tão divertida.
Liga a Tv, não está passando nada que ela goste.
Ela a desliga e vai dormir.
Mas só consegue pensar em que amigos seriam aqueles.
Achou muita intromissão perguntar.
Ele chega em casa.
Liga a Tv.
Que bom, está passando o programa do Jô.
Vê um artista que lhe é vagamente familiar.
O desgraçado começa a cantar uma canção sobre a solidão.
Ele diz um palavrão baixinho e desliga a Tv.
Vai se deitar, mas só consegue pensar em quem estava naquela festa.
Com certeza pessoas bem mais interessantes que ele.
Porque ela pensaria nele, afinal, se conhecia tantas pessoas e tinha tantas festas para ir?